Os momentos de sucesso desportivo são sempre possibilidades de reconstrução de comunidades que se formam, ao longo de anos, em volta dos clubes. As marcas da história são comumente relembradas como os feitos que sustentam a identidade das formações, mas, na verdade, são os seus adeptos e a capacidade de dialogar entre si que transforma os clubes em unidades relevantes na sua existência.
A visita do Sport Clube União Torreense ao Jamor é um desses momentos de construção de comunidade. Já se havia sentido com o aproximar das decisões, na Liga 3, nas partidas em casa frente ao Alverca e à equipa B do Vitória SC, com a reaproximação de muita gente que há muito tempo não frequentava o Estádio Manuel Marques. Mas o reatamento de uma tradição de viagem a acompanhar o clube potencia, de forma muito mais evidente, a comunidade de adeptos. Que se deslocam, convivem e vivem, juntos, um acontecimento relevante para história do seu emblema.
O grande desafio dos nossos dias, na ascensão ao futebol profissional, é garantir que esta comunidade se mantém sólida. Portugal não tem sido um bom exemplo. Na época de 2021/22, uma equipa da Primeira Liga (B SAD, com outras complicações associadas) e duas equipas da Segunda Liga (Académico de Viseu e Vilafranquense) não jogaram nos seus próprios estádios. Outros projetos com algum sucesso desportivo vão-se demonstrando incapazes de manter uma regularidade de adeptos nos seus encontros, com baixas assistências, sublinhando-se um afastamento entre os feitos dos clubes e a sua ligação ao local onde estão inseridos.
É uma preocupação que, para além do investimento desportivo, deve estar viva e presente no quotidiano dos clubes e, de forma mais elaborada, no pensamento da Liga Portugal. O adepto como unidade base do fenómeno cultural e empresarial do futebol é uma ideia que não pode ser abandonada, como tem sido ao longo de tantas épocas. Fortalecer as ligações aos adeptos e a ideia de comunidade que se reúne em volta de um fenómeno desportivo permitirá melhorar todos os outros aspetos da realidade futebolística nacional.
A discussão vai-se fazendo, de forma parcial, com sinais de preocupação no que toca às assistências nos estádios, tal como nas audiências que geram contratos que, em Portugal, são a base de sustentação económica da generalidade dos clubes, através do direitos televisivos e digitais. Mas é preciso ver o problema de uma forma global. E para que exista um mercado para o futebol português é, em primeiro lugar, fundamental que existam mercados locais para cada um dos clubes envolvidos nas provas nacionais.
Potenciar essas relações, aumentar os momentos de ligação entre clube e adeptos, abrir vias de comunicação e informação entre as diferentes partes poderão ser maneiras de responder, no imediato, a estes problemas. Mais poder-se-á fazer, olhando para exemplos de boas práticas noutros lugares, ao mesmo tempo que se poderá estudar e perceber as realidades sociais que levaram a que estes problemas se potenciassem nas más decisões da Liga. Um caminho que, na Federação Portuguesa de Futebol, também já foi entendido. Unir todas as partes para ter um quadro de competências mais forte já na próxima temporada é fundamental para ter melhores resultados, para lá do que cada clube poderá e deverá fazer.