Lembro onde estava na noite da primeira internacionalização do Cristiano Ronaldo. Fim de agosto, verão de 2003, no Manel Bar, na Praia de Santa Cruz. O jogo a passar numa pequena televisão, eu sentado ao balcão, a ver aquele miúdo de quem esperávamos muito (mas, seguramente, não tanto). Esse jogo, no Municipal de Chaves, até corria o risco de entrar para a história pela inusitada internacionalização de Bruno Vale, guarda-redes da equipa B do FC Porto, mas passaram-se quase dezoito anos e aqui estamos, a ver como o miúdo se transformou num acontecimento que o próprio futebol ainda luta por entender.
Nunca aconteceu nada como Cristiano Ronaldo no futebol europeu. Este é o seu quinto europeu, ninguém jogou mais jogos na prova do que ele, ninguém marcou mais golos na prova do que ele, ninguém teve mais jogos a marcar na prova do que ele, ninguém alcançou mais jogos com um mais de um golo do que ele. Tudo o que for recorde, Cristiano Ronaldo é parte da lista. Muitos dizem que é isso que o move. Eu, cada vez mais, creio que não. Não é o recorde que o move, é o nunca parar. E ontem, em Budapeste, num jogo que a Hungria quis encerrar num bloco baixo e Portugal demorou a conseguir desbloquear, percebemos que o Cristiano Ronaldo de 2021 acumula conhecimento e palavras sábias ao miúdo de quem esperávamos muito.
Nasci num tempo em que os grandes jogadores surgiam como promessas e desapareciam de forma muito mais misteriosa (numa lesão, num contrato, num desvario). Num tempo em que os grandes jogadores tinham uma grande época, três ou quatro no máximo, com uma outra época de apagamento pelo meio. Num tempo em que os grandes jogadores perdiam velocidade, perdiam dinâmica, mantendo a perspicácia que fazia correr a bola em lugar das pernas. Num tempo que Cristiano Ronaldo, em dezoito anos, destruiu com a sua longevidade, confundindo-se, por vezes, com uma peça de tecnologia, para nos demonstrar que o impossível não existe. E, se existir, veste a camisola 7 de Portugal.