Anéis Olímpicos


Houve um tempo em que era difícil ter acesso a muitos desportos. Vias os jogos das modalidades que se praticavam no teu bairro, na tua terra, e contavas os dias (e muitas vezes as horas, porque a certeza da transmissão só se confirmava com o seu início) para ver outras provas que, longe de imagens, só ouvias falar via rádio ou leras em alguma página dos jornais. Nesses tempos, o mundo olhava para os Jogos Olímpicos com uma sensação de acontecimento raro e único, o de ter um verdadeiro atleta a subir ao pódio para receber a medalha que confirmava o seu reconhecimento mundial. 

Foram tempos diferentes, em que os anéis olímpicos ofereciam um bilhete para coisas que quase não existiam durante quatro anos. Era aí que ficavas a conhecer os sacrifícios de quem lutara pela qualificação, muitas vezes sem os apoios devidos. Era nessa altura que sabias da existência de países que seguiam incógnitos ao teu conhecimento. Era então que criavas novos heróis para as brincadeiras dos dias seguintes. Em 2021, já não é a novidade, não é a acessibilidade, aquilo que te prende a estes anéis. É, creio, a possibilidade de ainda se repetir essa sensação de ver nascer um ídolo numa improvável madrugada de verão. 

Amanhã começam as competições, com o Softbol e o Futebol femininos a terem a honra de abrir as portas. Mas mesmo antes de se começar a jogar, já outras histórias vão tornando Tóquio num caso para vivermos o desporto de forma diferente. Julius Ssekitoleko, halterofilista ugandês que viajou para o Japão à procura de um derradeiro bilhete de qualificação, desaparecera do seu hotel, em busca de em terras do sol nascente encontrar um futuro melhor. Mas nem as pessoas têm, já, o condão de poderem desaparecer como quiserem. Encontrado pelas autoridades,  estará agora longe de qualquer tipo de sonho de verão. Nem o olímpico, nem o de um amor por terras do Japão.