Torres Vedras foi um bom lugar para crescer, enquanto adolescente com curiosidade pela cultura. Uma Biblioteca Municipal acessível e aberta ao diletantismo, os inúmeros concertos de música clássica nas Sala do GAT, o cinema e o teatro no Teatro Cine, completavam uma oferta pública, virada para quem vivia na cidade, que mais do que tentar satisfazer públicos, procurava, eventualmente sem programa, formar públicos. Eram, muitas vezes, as mesmas caras que pululavam de um evento para o outro, quase todas à procura de respostas para as perguntas que ainda não sabiam fazer.
Os concertos de bandas de garagem, as noites de jazz e as festas africanas da Sta Casa, a participação em grupos de teatro, em noites de poesia, mas, também, as noites nas festas das aldeias, as experiências associativas, as longuíssimas conversas sobre o tudo e o nada com gente que partilhava, umas vezes as preocupações, outras vezes apenas os espaços, completavam um mosaico que só mais tarde se deu a perceber como ficou definido. A questão, aqui, é a da criação das oportunidades. Abrindo para o contacto com a cultura pequenas portas que se transformam em desafios à população.
Não pude deixar de pensar nisso, a noite passada, enquanto assistia ao Concerto do Ensemble Darcos do Nuno Côrte-Real. Na forma como somos levados, perante o momento artístico, a fazer parte de algo que, mais do que ir além, nos leva a lugares de nós que estão ainda por descobrir. Na forma como tudo isso se conjuga, não enquanto elemento de excepcionalidade, mas como peça de um puzzle, mais complexo, mais exposto, porque Torres Vedras é sempre, mesmo quando não quer, um lugar onde se cruzam visões muito díspares de um mesmo mundo. Um mundo que pode fazer sentido, para lá da execução técnica perfeita, se nos transportar para uma outra forma de o entender - a ele e a nós.