Transparência: questão prática


Transparência é uma palavra que fica bem em qualquer discurso, mas que é mais difícil de encontrar quando se passa à prática. Em Portugal, vivemos numa cultura onde se promove, demasiada as vezes, a ideia de que “o chefe é que sabe”, a ideia de que “quem está lá dentro é que pode dizer”, pequenas ideias feitas que impedem a transparência das decisões, a reflexão sobre a forma como estas são realizadas, o traçamento de processos que conduzem até elas. A falta de transparência não é só uma consequência de uma má conduta de quem tem responsabilidades, é também da normalidade com que acaba por ser enfrentada pela nossa sociedade. 

É nessa tendência para a obscuridade que se perde a possibilidade de isenção, tendo em conta que esta nunca é uma assunção própria, mas resultado da avaliação realizada pelos outros. A integridade também pode ser colocada em causa, porque o não conhecimento de todos os elementos tomados em linha de conta para a decisão pode esconder conexões menos propícias à boa decisão. A objetividade das decisões, também ela, carece de possibilidade de avaliação neste tipo de quadros. No fundo, é toda uma organização que se vê afetada e que implica uma menor capacidade de dialogar com os cidadãos afetados pelas medidas tomadas. 

O adiamento da apresentação da Lei do Lobbying na Assembleia da República não pode, assim, ser considerado uma surpresa. Apesar de estar presente em programas de diferentes partidos, apesar de estar a transparência plasmada em muitos dos discursos e declarações de intenções, prolonga-se, no vazio legal, a política da mesa de almoço, do recado, do amigo. Uma cultura de aceitação desta realidade é uma cultura que não permite uma evolução para um quadro de gestão pública onde a transparência é, de facto, uma noção prática e não teórica. E é na prática que se demonstra, realmente, o programa que cada um defende para o país.