Num país onde a monocultura desportiva se transforma num fenómeno de massas, a necessidade de um pensamento sobre o papel do Desporto no desenvolvimento da população e do território é premente. No entanto, em momento algum esta temática tem entrado na discussão eleitoral, com visíveis consequências quando alguma matéria acaba por chegar a processo legislativo.
Nesse sentido, procurei consultar os programas eleitorais disponíveis nas páginas das diferentes forças políticas com assento parlamentar. Foram analisados os programas do Partido Socialista (PS), Partido Social Democrata (PSD), Bloco de Esquerda (BE), Coligação Democrática Unitária (CDU), Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP), Pessoas Animais Natureza (PAN), Iniciativa Liberal (IL), Partido Chega! (CH) e Livre (LIVRE) na busca da presença de medidas que tocam a realidade do Desporto e da Atividade Física.
A realidade demonstra grandes discrepâncias no tratamento do tema pelas diferentes forças políticas. PS e CDU são as duas forças com maior desenvolvimento nesta área temática, seguidas de BE e PAN. As restantes forças partidárias fazem poucas menções a questões ligadas ao desporto, sendo de sublinhar o facto de nenhuma das forças ter qualquer menção sobre a indústria do desporto, uma realidade tantas vezes aplaudida nos discursos oficiais, mas sem a mínima presença ou reflexão em programa eleitoral.
De uma forma geral, o Desporto não parece ser um tema com suficiente reflexão, nem ao qual é dada especial relevância na execução de programas eleitorais. Num momento em que existe um amplo consenso internacional sobre a importância do desporto e das suas implicações na saúde, no desenvolvimento pessoal e cultural, na coesão social e territorial, na ciência, na indústria e no turismo, urge que mais forças partidárias consigam estabelecer pensamento sobre o mesmo. Especificamente, no que toca a Portugal, o Desporto precisa de uma maior aposta e investimento quanto à prática regular durante toda a vida, mas poderá também beneficiar de uma melhor organização e atenção nas suas dimensões económicas, pelo que será importante que o futuro reserve uma maior atenção para o fenómeno.
As propostas para o Desporto das diferentes forças partidárias
No caso do Partido Socialista, o estímulo da atividade física e desportivo foca-se em dois objetivos principais, a afirmação de Portugal no contexto desportivo internacional e a colocação do país no lote das quinze nações europeias com cidadãos fisicamente mais ativos na próxima década. As medidas apresentadas têm uma abrangência mínima sobre diferentes áreas, desde a promoção do Desporto Escolar, a dinamização da preparação olímpica e paralímpica, o impulsionar de programas de seleção desportiva, a articulação entre sistema educativo e movimento desportivo, a reintegração de atletas de alto rendimento na vida ativa, a reabilitação do Parque Desportivo e o incentivo ao turismo desportivo. Reforçando o papel do desporto enquanto fator de coesão social e inclusão, faz ainda referência à erradicação de comportamentos e atitudes violentas, de racismo, xenofobia e intolerância, bem como ao combate à dopagem, à manipulação de resultados e a outras formas de perversão da verdade desportiva.
A Coligação Democrática Unitária reafirma o programa de 2019, onde coloca a Educação Física e o Desporto como meios de valorização humana e factor de desenvolvimento da personalidade e democratização da vida social. A democratização da Cultura Física é enquadrada com medidas como a imposição da Educação Física durante toda a escolaridade, a realização de campanhas de incentivo à prática desportiva no trabalho, o apoio ao desporto adaptado e à investigação científica, a garantia do cumprimento da regulamentação do desporto profissional. O papel dos clubes desportivos e do movimento associativo visto como a base de uma política desportiva que valoriza aspetos sociais e culturais, é ainda valorizado num processo que deverá assegurar o acesso em igualdade à prática desportiva, sem barreiras de género. A CDU defende ainda a revogação do atual quadro da administração pública desportiva, preferindo a criação de um serviço central de administração direta do Estado, dotado de autonomia.
As propostas do Bloco de Esquerda dividem-se entre a realidade escolar, onde o desporto e outras áreas técnicas devem ser salvaguardadas, e a visão do desporto como motor de inclusão social. As suas medidas focam-se na valorização da nota de Educação Física na média do Ensino Secundário, o reforço e equiparação de bolsas de atletas paralímpicos e olímpicos, na valorização do desporto escolar e no combate à violência no desporto, apostando numa maior fiscalização por parte de entidades competentes ao fenómeno dos grupos organizados de adeptos. O programa do BE faz ainda menção ao crescimento de uma cultura homofóbica no Desporto e como esta deve ser combatida.
Finalmente, o PAN inclui a prática de atividades físicas e desporto nos elementos dedutíveis no IRS, aposta na acessibilidade à informação e comunicação em várias áreas, incluindo o desporto, e foca o seu programa na escola, sublinhando que a escola é um espaço privilegiado para o acesso à prática do desporto. Nesse sentido preconiza a afinação de recursos entre escolas, associações e clubes desportivos, a valorização da educação física enquanto disciplina e a visão do desporto escolar como ferramenta educativa essencial. O Desporto deve também ser recentrado nas prioridades educativas, com maior atenção sobre a formação de professores, nos horários da educação física, na dotação de meios financeiros para as autarquias apoiarem a prática desportiva e na valorização do desporto saudável e do fair play.
Nas restantes forças políticas, o Desporto está escassamente representado nos programas eleitorais.
O Partido Social Democrata não dedica nenhum capítulo ao tema, estando estranhamente ausente do seu foco (e mais quando se sabe que o programa segue, na sua larga maioria, as linhas do programa de 2019). O Desporto surge mencionado no âmbito das políticas do envelhecimento saudável, nas iniciativas de apoio a cidadãos em situação de exclusão ou marginalização, na criação de programas ligados à saúde e à promoção de estilos de vida saudáveis.
O CDS-PP, do qual apenas tivemos acesso ao Compromisso Eleitoral, entende valorizar o desporto na actividade escolar pela sua importância no desenvolvimento pessoal e na saúde pública, e reforçar as verbas para o desporto de alto rendimento.
O Partido Chega! apenas defende o Desporto na defesa da qualidade das instituições, promovendo a autonomia das mesmas, enquanto a Iniciativa Liberal, evocando a antecipação das eleições, não validou as propostas para a área, pelo que estão ausentes do seu programa.
O Livre também tem referências escassas ao desporto no âmbito da saúde, sublinhando a importância da disciplina de educação física e o Desporto Escolar.
Como nota para as forças que não têm representação parlamentar, o Volt apenas refere o Desporto na reforma das metas curriculares, enquanto o MAS não faz qualquer menção ao tema.