Um manifesto otimista incita ao voto


Talvez seja necessário pedir-se pouco para manter um certo otimismo nos dias que passam, mas permito-me esse respirar no último dia de campanha eleitoral. Aquilo que vivemos nestas últimas semanas permitiu uma clara clarificação de campos ideológicos, de posicionamentos perante o governo do país, que não podem deixar de ser uma coisa boa, para quem achava que o mundo se rege pela dicotomia entre competentes e incompetentes. Pela forma como uns agiram no poder, pela forma como outros o tentam assaltar, ficamos esclarecidos. Pelas propostas que cada força política tem no centro do discurso, não nos restam muitas dúvidas. Poderá ser difícil desenhar um quadro de maioria no parlamento que sair das eleições do próximo domingo, mas poucos poderão dizer que não saibam ao que vão. Será a democracia a funcionar. 

Não deixa de contribuir para esse otimismo a certeza daquilo que aconteceu durante os últimos seis anos foi o estabelecimento de pontes necessárias para o futuro que viveremos. O alargamento das vozes no espaço parlamentar e o crescimento de soluções possíveis dentro desse quadro é um ganho de maturidade para a nossa democracia. Muitos preferem esquecer o quão breve é, ainda, o tempo de democracia que respiramos, com tantos daqueles que decidem os destinos do país ainda embrenhados em quadros mentais e formativos que advém de outros regimes de identidade. A aproximação à Europa, a abertura a novas discussões, o crescimento de novas tendências de pensamento tem um desenvolvimento bastante lento no que é o quadro cultural do país. Muitas coisas estão ainda por conquistar, mas os horizontes de luta são sempre promissores para quem não os teme. 

Precisamos de quem entenda o estado social como o centro da ação política, a capacidade de criar condições para todos e todas poderem desenvolver a sua vida, formando-se e preparando-se desde a sua escolaridade, com opções de trabalho e emprego que lhes permitam pertencer a comunidades que vivam seguras e protegidas, cientes de que o seu esforço é uma dádiva para todos, da qual recebem uma justa parte. Precisamos de continuar a encontrar respostas que permitam o acesso à educação, à habitação, à saúde e à alimentação, da mesma maneira que precisamos de encontrar formas de participação que tragam de volta ao debate largas franjas da nossa sociedade que foram ficando de fora (seja por nossa iniciativa, seja por iniciativa deles). Uma verdadeira democracia é múltipla, transparente e consequente. Uma forte razão para que todos se possam sentar para discutir as propostas que tiverem para o país. 

Talvez seja necessário perceber o muito que recebemos para poder fazer as contas aquilo que desejamos. Pensar na forma como a nossa estrutura comunitária cresceu ao longo dos últimos 48 anos, com mais condições para viver, para estudar, para trabalhar. Pensar na maneira como pequenos pormenores nos permitem uma liberdade que para os nossos avós foram, durante grande parte da sua vida, apenas uma miragem. 48 anos de avanços e retrocessos, é certo, mas que não deixam de fazer sentido nas lutas diárias em que nos envolvemos. É por isso que precisamos de ser otimistas. Na forma como aceitamos discutir aquilo que pensamos, na maneira como desconstruímos aqueles que nos querem desviar do nosso caminho. Num mundo aparentemente caótico, os contributos precisam de vir de todos os lados. Como aquele que, por exemplo, esta semana, permitiu que a população de Runa volte a ambicionar ter a sua freguesia desanexada de Dois Portos. O esforço da sua população, da plataforma Runa Acontece e das diferentes forças da Assembleia de Freguesia é um bom exemplo daquilo que temos para fazer. 

É possível que muito deste pensamento tenha estado obstruído pelas vozes que se levantaram em debates, pelas perguntas que se focaram em temas secundários da governação ou pelas contas estratégicas engendradas por um excesso de sondagens de curto alcance que acabaram, necessariamente, por poluir parte daquilo que temos que fazer e entender em campanhas eleitorais. Mas a vida seguiu o seu caminho e, para lá do barulho das luzes, as pessoas continuam a ter noção daquilo que precisam para fazer o seu caminho. Eu farei o meu, é certo com a esperança de que muitos outros me acompanhem, mas seguro da necessidade de continuar a refletir sobre as formas de nos entendermos em democracia. Domingo não é dia para ficar em casa.